sexta-feira, 26 de abril de 2013

O ESPORTE NOS EUA, PELO CORRESPONDENTE LUGUI



Lugui, um dos participante da Carvana de boleiros que marcou presença na nossa viagem para Saquarema, desta vez viajou para os Estados Unidos.

Viajou para tirar férias e curtir um pouco de um país que gera reações diversas que vão dos fascínio a a revolta.

Mas seja como for não é possível negar que os EUA são um país onde se pode assistir e praticar uma diversidade de modalidades esportivas. Sendo assim trata-se de um local que esportivamente merece toda atenção e a análise crítica e aguçada de um pesquisador atento e refinado.

Lugui, você pode cantar por aí:

"Esse cara sou eu..."


Lugui é o cara !


Segue abaixo o primeiro texto do nosso correspondente



Sobre vossas cabeças, nuggets

                         Por Luiz Guilherme Burlamaqui, ou melhor, Lugui

                Foi o meu primeiro jogo de basquete da NBA: San Antonio Spurs contra Golden State Warriors. Era um jogo morno e para lá de chato, com ambos os times já classificados para os play-offs. Numa das inúmeras propagandas dos intervalos do jogo, a repórter anunciava o novo preço do McNuggets: Cinco dólares por um pacote com vinte. Desde o meu primeiro evento esportivo aqui (uma partida de soccer), passei a me acostumar com as propagandas e promoções absurdas que circundam o espetáculo-esportivo. “Two on the net pollo you get”, prometiam os donos da cadeia “Pollo Loco”, nas partidas de futebol. E frango para todo o estádio. “Jamba Juice is free tonite if Sandoval scores a home run”. E todos nós, fãs dos Giants, podíamos nos deliciar com um suquinho de melancia. Mas nada era como essa propaganda do Mc Donalds.

Depois de anunciar o novo preço, a locutora fez um anuncio que levou à histeria coletiva o Ginásio inteiro: “E agora, olhem para o teto, porque o Mc Donalds preparou uma baita surpresa para hoje à noite”. Parecia uma cena de um filme surrealista: naquele momento milhares de caixinhas de Mc Nuggets caíram lentamente sobre nossas cabeças, num micro paraquedas. Mais de cem caixas de nuggets. Abaixo, os torcedores, ou melhor, os “customers”, como que esperando a benção divina, se digladiavam para ver quem seria abençoada com o prêmio. Eu, para minha tristeza e, acima de tudo, fome, no setor mais barato do estádio, não pude brigar pelos nuggets: só os bem-afortunados, localizados nos lugares mais próximos à quadra e mais caros, é que seriam agraciados com tal benesse.

Nenhuma história parece resumir melhor a faceta do consumo que circunda um evento esportivo norte-americano. Por mais que persistam certos valores cardinais relativamente comuns aos valores do “pertencimento clubístico” – fidelidade, etc (“How many games you’ve been last season?”, é uma pergunta que costumo ouvir com certa frequência antes de noticiar minha brasilidade) – tais valores estão completamente subsumidos à lógica do consumo. Raramente o termo fan é utilizado, e quase sempre é substituído pelo de customer.

Fenômeno coletivo, a experiência de torcer é altamente individualizada, não há nada similar a uma torcida organizada, muito menos algo comparável ao “ir junto” ao estádio, como de hábito no Brasil. No caso do futebol, apesar dos cantos entoados por uma torcida, a sensação de estranhamento bateu forte quando, no momento do gol, não vi torcedor nenhum a se abraçar. Prestei bastante atenção: e só vi eram palmas e punhos estendidos de forma individual, sem contato com o colega do lado, mesmo se amigo, irmão, namorada, ou filha. Nos jogos de baseball, pode-se dar ao luxo de dar um “high-five” no seu colega do lado, mas isso é tudo pessoal.

Hierarquizado pelo preço, a hiperssegmentação do estádio reflete este sentimento. Existem mais de dezessete faixas de preço para comprar um ingresso, que podem variam desde oito dólares até quinhentos dólares. Salvo os “bleachers” (arquibancada, vá!), todos os lugares são rigorosamente marcados. No estádio, há atrações para todos os lados e se consome praticamente o que se quiser. Um rápido adendo: o conceito de campo esportivo tem sido, com alguma frequência, sobre utilizado para o caso brasileiro. Não há, a rigor, um campo esportivo brasileiro stricto senso porque não há praticamente “concorrência” alguma entre o futebol e os demais esportes. Aqui, os times precisam inventar milhares de estratégias de fidelização: em outras palavras precisam criar mecanismos de convencimento: “por que vou assistir baseball, se, no mesmo horário, posso acompanhar a equipe de Hockey?”. Em projeto considerado vitorioso, o próprio “dono” dos Giants disse, que, anos atrás, ao assumir um time assumiu como estratégia criar um contingente de 3, 3 milhões de fãs, mas que precisaria “tirar um pouco da atenção da cidade 49ers (time de futebol americano)”. E, essa concorrência entre os dois esportes preferidos aqui espanta porque o calendário esportivo americano é pensado tentando evitar as disputas, pois quando o baseball se inicia o futebol já se encerrou.

Esta “consciência” da concorrência faz, por exemplo, com que o San Francisco Giants, por exemplo, fideliza seus consumidores dando “prêmios” a quem chegar primeiro ao estádio. Num dos jogos que fui, ganhei um pequeno “snowglobe”, destes de filme, com a cidade de San Francisco representada no dia da vitória da World Series of Baseball. Há uma agenda até o final do ano com a lista de todos os prêmios que serão distribuídos e há mesmo para todos os gostos: eles variam numa esfera que vão desde “guarda-chuvas” até jogadores miniaturizados, passando por prêmios mais comuns como camisas, bolas, calendários, etc. Neste particular, as crianças são motivos de grande atenção no espaço do estádio: existem milhares de atividades pré-jogo destinadas a elas, com distribuição de prêmios, brindes, etc. Tudo feito ao gosto do consumidor.

Por fim, o momento sublime da estupidez do consumo (e não resisto à adjetiva-la neste texto que envio a amigos) é o momento de “aparecer no telão”. Nada faz um “consumidor” tão feliz quanto se ver na tela do estádio: são os cinco segundos de fama prometidos por Andy Wahrol, e os cinco segundos mais sublimes. Para aparecer no telão, faz-se de tudo um pouco: dança-se, fantasia-se, namora-se, etc. Há momentos destinados à fama de todo torcedor, e até mesmo este que vos missiva foi agraciado com seus cinco segundos de glória.

Espelho do mundo moderno, os esportes americanos são uma verdadeira mina de ouro para a compreensão das nossas sociedades contemporâneas cada vez mais permeadas pela lógica do consumo e pelo verniz do espetáculo. Neste mundo de bens, em que a inclusão do indivíduo passa pelo acesso ao mercado e às mercadorias, quase tudo pode ser condensado na imagem de nuggets voando sobre nossas cabeças.  




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