quarta-feira, 25 de fevereiro de 2015

Futebol com cupim


Em 2013, o Engenhão foi interditado devido a alegação da existência de problemas na cobertura do estádio que podiam colocar em risco a segurança dos frequentadores. Essa alegação se deu por parte do Consórcio Engenhão, tendo como base o relatório técnico feito pela empresa alemã SBP (Schlaich Bergermann und Partner).

De acordo com esse relatório, a cobertura do Engenhão, devido a algumas falhas em sua projeção, precisava de reparos já que se mostrava perigosa e frágil sobretudo em caso de fortes ventanias. 

Essa conclusão chegou a ser contestada pela ABECE – Associação Brasileira de Engenharia e Consultoria Estrutural  mas ficou mantida a decisão de fechamento do Engenhão e da necessidade de se fazer os reparos para que se pudesse voltar a receber público.

O laudo final emitido pela Comissão Especial de Avaliação do Engenhão pode ser acessado na página da Prefeitura do Rio de Janeiro ( http://www.rio.rj.gov.br/dlstatic/10112/4150419/4100267/Comissao.Especial.de.Avaliacao.do.Engenhao..LaudoFinal.pdf) 

Não sou engenheira e, portanto, me parece descabido emitir uma opinião a respeito da pertinência do laudo da empresa Alemã. Entretanto sempre me pareceu absurda a necessidade de se interditar um estádio construído a menos de sete anos e que custou cerca de R$380 milhões aos cofres públicos.

Nas andanças que faço com a Caravana, percorro estádios com estruturas próximas a ruínas, mas tais espaços costumam ser estádios geralmente antigos, pertencentes a clubes sem poder aquisitivo que consiga mantê-los conservados.

Já o Engenhão é um estádio que há pouco tempo era sinônimo de modernidade, sendo uma das primeiras e, provavelmente, a mais representativa construção de uma época de transição dos estádios para as chamadas arenas, aqui no Brasil. 

Porém, o Engenhão tornou-se ruína já na sua juventude.

O estádio é parte integrante de um futebol com cupim.

Me inspiro no poema "Paisagem com cupim"  de João Cabral de Melo Neto a cujo trecho recorro para começar essa postagem:


"Tudo se gasta mas de dentro:
o cupim entra os poros, lento:
e por mil túneis, mil canais, as coisas desfia e desfaz
Por fora o manchado reboco vai-se afrouxando,
mais poroso, enquanto desfaz-se, intestina,
o que era parede, em farinha.
E se não se gasta com choques,
mas de dentro, tampouco explode.
Tudo ali sofre a morte mansa
do que não quebra, se desmancha"




O futebol brasileiro está repleto de cupins e o Engenhão é parte integrante dessa paisagem.

Até quando assim ele ficará, não se sabe


Cadeiras vazias também falam

O jogo entre Fluminense X Vasco conseguiu reunir um público de 7.338 pagantes e 8.658 presentes. 

Sem dúvida é um péssimo público em se tratando de um clássico carioca, o que serviu para alimentar as incansáveis manchetes sobre as baixas médias de público desse campeonato.

O Cariocão tem sido um saco de pancadas de vários colunistas e comentaristas esportivos. Ele virou uma espécie de bode expiatório dos problemas que afligem o futebol nacional. 

De fato desde que a Federação - em acordo com os clubes - adotou os pontos corridos e o turno único, o Campeonato Carioca perdeu mais ainda as poucas forças que lhe restavam.

Mas este ano está difícil de ser superado. Nele tem-se  feito de tudo para tornar o Carioca um campeonato chato, previsível e, até mesmo, antipático. 

O caso do clássico entre Fluminense x Vasco é mais um entre tantos outros que só servem para tirar o apetite futebolístico de qualquer um.


Inicialmente marcado para o Maracanã, o jogo foi levado para o Engenhão graças a disputa em torno do lugar onde a torcida do Vasco ficaria. O Presidente do clube Cruzmaltino bateu o pé exigindo que a torcida assistisse ao jogo no lado direito das cabines de rádio do Maracanã, local tradicionalmente por ela ocupado desde 1950.

Ocorre porém que aquele Maracanã de 1950 não existe mais, tendo sido amplamente modicado após sua última reforma para a Copa de 2014. 

Além disso, esse "novo Maracanã" tem contrato travado com o Fluminense estabelecendo que sua torcida - em caso de mando de campo do tricolor - ocupará justamente o lado direito das cabines de rádio. 

Essa discussão portanto é absolutamente infrutífera, sem sentido, se reduzindo a mais uma simples queda de braço política.

A solução encontrada foi realizar o clássico no Engenhão cuja capacidade está reduzida para cerca de 17 mil pessoas.

O preço dos ingressos para Fluminense X Vasco variaram de R$50 (Setor Sul e Norte) a R$80 (Leste e Oeste inferior). Vale lembrar que as alas Sul e Norte não proporcionam uma boa visão do jogo sobretudo se o torcedor nas cadeiras inferiores. Esses setores não deveriam custar R$ 50 ...

A partida envolvia dois times que tiveram atuação pífia nos seus jogos do meio de semana.


Agora vem a facada final: assim como ocorre no Maracanã, comer e beber no Engenhão exige bolsos cheios. Um simples copinho de água custa R$ 3





As cadeiras vazias do Engenhão falavam que muita coisa precisa mudar no futebol brasileiro


Os setores inferiores Leste e Oeste praticamente vazios, ambos custavam R$80 a entrada inteira





O Engenhão, um projeto ainda em construção

Comecei esta postagem com um tom razoavelmente revoltado e provavelmente terminarei do mesmo modo.

Mas no meio do caminho é preciso respirar um pouco para que não se pinte um quadro onde apenas problemas são vistos.

Embora ainda cercado de problemas, o Engenhão - que agora pode ser chamado de Estádio Nilton Santos - é um estádio que me provoca certa admiração. 

Particularmente adoro imaginar que em 2016, parte dos olhos do mundo se voltarão para um pedaço do subúrbio carioca e isso ocorrerá porque é no Estádio Olímpico que se realizarão importantes provas como o atletismo. 

O estádio foi erguido no bairro do Engenho Novo, no terreno que abrigava as oficinas de restauração de trens que passaram a funcionar a partir de 1871 e lá se mantiveram até a década de 1970:


Fonte: http://blogsobreostrilhos.blogspot.com.br/2013/12/oficinas-do-engenho-de-dentro.html

Fonte: http://blogsobreostrilhos.blogspot.com.br/2013/12/oficinas-do-engenho-de-dentro.html

Em 1984 foi criado o Museu do Trem administrado pela Rede Ferroviária Federal





Cercando o Engenhão temos as ruínas das Oficinas de trens, uma importante parte da memória da cidade do Rio de Janeiro









A ideia de construção de um estádio Olímpico no Rio de Janeiro foi alimentada desde a década de 1990, época em que a Prefeitura começou a elaborar uma série de planos de melhorias na cidade visando o projeto de candidatura do Rio para as Olimpíadas de 2004.


Mas foi com a Candidatura para o Pan-2007 que o projeto do estádio foi levado adiante. 


Não vou me estender nesse assunto, porque há um ótimo estudo realizado por Martin Curi intitulado "Espaços da Emoção: arquitetura futebolística, torcida e segurança pública" (Tese de Doutorado em Antropologia, Universidade Federal Fluminense, 2012). 


O estádio começou a ser erguido em 2003 com previsão de entrega para 2005, mas somente em 2007 ele ficou pronto

Fonte: http://www.portal2014.org.br/blog/noventa-minutos/index.php/2011/05/31/o-engenhao-como-exemplo-a-nao-ser-seguido/

Fonte: http://www.portal2014.org.br/blog/noventa-minutos/index.php/2011/05/31/o-engenhao-como-exemplo-a-nao-ser-seguido/

Oficialmente, o nome do Engenhão é Estádio Olímpico João Havelange, mas recentemente o clube Botafogo ganhou o direito de usar o nome Estádio Nilton Santos, em homenagem a um dos maiores jogadores da história do futebol brasileiro.

Espero também que essa mudança ajude a dar novos e melhores rumos ao Engenhão, um estádio que ao longo de sua história ainda não conseguiu cativar os torcedores cariocas e que leva a fama de não atrair o público torcedor. 

Bocas maldosas o apelidaram de "vazião".

Tentei buscar dados concretos que corroborassem ou não com essa fama e encontrei alguns interessantes:

Segundo Martin Curi, no ano de 2009, a média de público do Botafogo no campeonato brasileiro foi de 17.890 uma média que nesse ano superou a média nacional de 17.800 (CURI, 2012, 152)

Porém, dados mostrados no Blog do Juca indicam que no que se refere aos clássicos cariocas, o Maracanã é mais frequentado que o Engenhão:


 (Fonte:http://blogdojuca.uol.com.br/2013/11/maracana-goleia-o-engenhao-ate-mesmo-em-gols/)




Se perguntarem porque o Engenhão ainda tem dificuldades de encher a casa, provavelmente você ouvirá as seguintes respostas:


  • O estádio é longe
  • É difícil de chegar ao estádio 

Vamos lá:

1. "O Engenhão é longe". 

Longe em relação a qual lugar?

Longe, no Rio de Janeiro, significa antes de tudo estar fora da zona sul, lugar muitas vezes tomado como parâmetro que mede o que fica longe e perto na geografia carioca. Longe geralmente são consideradas as zonas suburbanas, como aquela em que se localiza o Engenhão.

É provável que se o estádio fosse localizado na Barra da Tijuca, a reclamação da lonjura fosse praticamente inexistente. Embora seja um bairro que esteja fora do circuito zona sul, trata-se de um lugar que ocupa lugar privilegiado no imaginário carioca. 



2. "É difícil chegar ao estádio"

Ora, o estádio localiza-se em frente a uma estação de trem e à beira da Linha Amarela, uma via expressa que corta a cidade. Isso sem falar da boa oferta de ônibus do entorno cujos destinos variam de Madureira a Copacabana. 

Ir de carro não é nada aconselhável, embora conte com estacionamento, trata-se de um espaço que não comporta muitos carros e cujo preço pode ser salgado.

Ir de carro, aliás, não é aconselhável para a grande maioria dos estádios não só do Brasil. 


Então qual o problema do Engenhão


O que ocorre com o Engenhão é que ele ainda não conseguiu adquirir uma espécie de aura como ocorreu com Maracanã, o que ainda não possibilitou a criação de elos afetivos entre a comunidade torcedora e o estádio. 

Mais uma vez recorro a Curi: "Este estádio [o Maracanã] tem história, atmosfera, 'mana'. Ele é conectado como um lugar mágico à comunidade local (...) enquanto o Maracanã se tornou um lugar, o Engenhão continua um espaço" (154)

O Maracanã levou tempo para criar esse capital simbólico que lhe confere um lugar quase sagrado no imaginário futebolístico nacional que o faz ser chamado de templo.

Nada impede que um dia o Engenhão consiga status próximo e para que isso ocorra é importante nos despir de certos preconceitos que como tal são fundados em estereótipos e falta de informação.

Creio que as Olimpíadas de 2016 podem contribuir para reconfigurar a imagem do Engenhão e torná-lo uma praça esportiva importante e, sobretudo, usada no Rio de Janeiro.


O JOGO: FLUMINENSE X VASCO

Cercando o Engenhão temos ruas muito movimentadas em dias normais e que em dias de jogo podem ser trafegadas com toda tranquilidade a pé:





A arquitetura do bairro Engenho de Dentro é típica dos subúrbios cariocas, abrigando casas de família, muitas das quais que se abrem para a venda de comida, bebida, camisas de clube etc. 




Ao lado das casas tipicamente suburbanas nascem condomínios residenciais, paisagem que tem se tornado típica nos bairros vizinhos e que provavelmente também são estimulados pela chegada das Olimpíadas de 2016






Vi muitas placas de "vende-se" nos arredores do Engenhão, o que pode indicar muitas explicações que variam desde a insatisfação com o local ou a tentativa de aproveitar alguma possível valorização do bairro devido ao Engenhão e às Olimpíadas:






Sempre que vou ao Engenhão como salsichão e tomo cerveja sentada no meio fio da rua, enquanto observo a chegada dos torcedores. Essa atmosfera típica de ruas do subúrbio confere ao Engenhão um ambiente receptivo que, entretanto, não exclui o caos provocado pelo trânsito e pela multidão circulante. 









Mas no domingo, não havia o que poderíamos chamar de multidão. Por isso, foi razoavelmente fácil comprar ingresso horas antes do jogo, principalmente na bilheteria Leste, aquela dos ingressos a R$ 80




Já a bilheteria do Setor Sul embora mais cheia, também estava tranquila 




Bem... como podem perceber comprei ingressos para o lado Leste, destinada a torcida do Vasco.


NO ESTÁDIO....

Por fora e por dentro, o Engenhão está cercado de maquinarias e de claros sinais de que se trata de um estádio que embora novo já está com cara de velho:













Esses telões já foram modernos... hoje um deles está apagado




Isso aqui já foi uma pista de atletismo.....  e espero sinceramente que volte a ser








COMO UM ESTÁDIO PODE SER DESCONFORTÁVEL E A PERIGOSA EXALTAÇÃO DA AUTORIDADE DESMEDIDA


Um fenômeno interessante e preocupante se fez presente no jogo do último domingo. 

Cerca de 127 torcedores foram presos devido a possível envolvimento com brigas antes e depois da partida entre Fluminense X Vasco

Me assusta ver a indiscriminada celebração que grande parte da imprensa fez dessas prisões, sendo que alguns dos torcedores foram encaminhados para o presídio de Bangu 10, acusados de formação de quadrilha.

Ainda me impressiona como no Brasil há um gosto por políticas autoritárias e abusivas. 

Ainda me impressiona como no Brasil se confunde segurança e justiça com prisão. 

É importante lembrar que o Brasil é um dos países em que mais se realizam prisões no mundo, mas prisões de pessoas que cometeram delitos pequenos e que somente contribuem para superlotar as penitenciárias do país. 

Longe de ser favorável a violência, sou menos favorável ainda a modos pouco planejados de combatê-la, e, especialmente, da ausência de uma política que vise preveni-la.

Li recentemente o artigo "Administrar a violência nos estádios da Europa: quais racionalidades", da jurista e criminóloga francesa Anastassia Tsoukala. Esse texto foi publicado no livro Hooliganismo e Copa de 2014 (organizado por Bernardo Borges Buarque de Hollanda e Holoisa Baldy Reys).

Domingo, no Engenhão, lembrava das preocupações de Anastassia no que diz respeito aos excessos cometidos em alguns países da Europa, na ânsia de deter o hooliganismo:

A banalização de um clima de escalonamento e radicalização, portanto, acabou por afastar formalmente qualquer abordagem alternativa, potencialmente centrada sobre atores sociais além dos agentes de segurança , ou mesmo sobre os torcedores, com atores capazes de desenvolver mecanismos de autorregulação ou capazes de erigir como interlocutores valiosos aos olhos dos tomadores de decisão. Lutar somente contra os sintomas do hooliganismo, enfim, acabou por focalizar as políticas de controle sobre o único objetivo de proteger a ordem pública em detrimento da ordem democrática (2014, 29)


É bom atentar para o fato de que esta ponderação se faz em relação a países como França e Inglaterra que de fato possuem instituições voltadas para o planejamento de ações e preparo de pessoas para atuarem em estádios de futebol.

Não é o caso do Brasil. 

Embora seja importante ressaltar o trabalho do GEPE, esse grupamento ainda não conta com o aparato necessário a torná-lo apto a atuar junto à multidão.

Infelizmente no Brasil, segurança em estádios confunde-se com confronto e com a notável tendência de criminalização do torcedor. 

Estádios desconfortáveis são aqueles em que temos que torcer diante de um policiamento munido de cassetete pronto para ser usado caso qualquer comportamento considerado nocivo à ordem seja adotado.

Esse mesmo policiamento é válido dizer que é mal remunerado e mal preparado para atuarem junto à multidão. São portanto parte componente de um mecanismo de retroalimentação da violência.









Voltando para casa, consegui pegar um ônibus por pura sorte e ao longo do trajeto, enquanto o veículo esteve na rota de torcedores, não parou para nenhum passageiro entrar.

Estamos à beira da criminalização do ato de torcer.

E não é suficiente afirmar que isso se deve ao comportamento das torcidas organizadas, porque sequer sabemos exatamente o que são e quem compõe esses agrupamentos que existem desde a década de 70, no Brasil, e precisam ser compreendidos para além do rótulo da violência. 

Sim, tenho tido certo desgosto de ir a jogos de futebol, porque são muitas as violências que são cometidas: os altos preços de ingressos, o baixo nível da qualidade das partidas, muitas vezes provocado pela discrepância financeira entre os clubes, as inúmeras proibições a entradas de faixas, bandeiras, camisas, a truculência do policiamento e sua falta de preparo.

O futebol brasileiro está mesmo com cupim:

                                             "E se não se gasta com choques,
mas de dentro, tampouco explode.
Tudo ali sofre a morte mansa
do que não quebra, se desmancha"




A cultura torcedora precisa ser respeita e não reduzida a um  conjunto de normas muitas vezes arbitrárias que muitas vezes ferem as bases de uma sociedade democrática.


terça-feira, 3 de fevereiro de 2015

NO CAMPEONATO CARIOCA, MILAGRES ACONTECEM

O que mais se discute atualmente em relação ao campeonato carioca são os preços do ingresso. Esse assunto tem rendido polêmica e até mesmo agressões verbais entre dirigentes cariocas.

O problema dos ingressos certamente se relaciona a inúmeras questões cuja análise deveria ser feita sem superficialidades e, sobretudo, não deveria se limitar a um simples embate entre clubes e Federação.

Outro pensamento que deve ser evitado diz respeito a imaginar que o pouco público no campeonato carioca é derivado apenas dos preços dos ingressos.

É certo que ingressos caros tendem a afastar o público especialmente em se tratando de jogos que por si mesmos podem despertar pouco interesse.

Mas quando se fala da baixa média de público no Carioca esquece-se de comentar um grave problema que há tempos é perceptível não apenas na série A desse campeonato, mas também – e principalmente - nas séries inferiores. 

Mais grave do que o preço do ingresso, são as más condições financeiras de clubes como Bonsucesso, Madureira, Bangu etc que frequentemente encontram dificuldade em montar times competitivos, assim como não conseguem manter seus estádios abertos ao público, por falta de condições de cumprir as exigências do estatuto do Torcedor e da Ferj.


Sendo assim, alguns clubes –  bastante tradicionais - são impossibilitados de usarem seus próprios estádios para a realização de jogos dos quais é o mandante.

Para que um estádio seja aberto ao público, a Ferj exige os seguintes laudos: Vigilância Sanitária, Polícia Militar, LPCI (laudo de proteção contra incêndio) e o LVE (laudo de vistoria e engenharia, feito pelo Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura).

Até o dia 29 de janeiro, segundo documento emitido pela FERJ, Resolução da Diretoria, RDI Nº 004/15, estavam impossibilitados de receber público os seguintes estádios:
♦AD Cabofriense – (Estádio Alair Corrêa)
♦ Bangu A.C – (Estádio Guilherme da Silveira Filho)
♦ Barra Mansa FC – (Estádio Leão do Sul)
♦ Bonsucesso FC – (Estádio Leônidas da Silva)
♦ Botafogo FR – (Estádio Olímpico João Havelange)
♦ Nova Iguaçu FC – (Estádio Jânio de Moraes)
♦ Resende FC – (Estádio do Trabalhador)”

Por esse motivo, domingo, dia 01/02, o Resende teve que jogar com o Bonsucesso longe de sua casa, assim como o clássico do subúrbio carioca Bangu X Madureira foi realizado, nesse mesmo dia, em Los Larios, em Duque de Caxias.

Escolhi o jogo Resende X Bonsucesso para inaugurar a Caravana do Cariocão 2015, porque ele me parecia ser um exemplo interessante para demonstrar que o baixo público do campeonato Carioca tem explicações que não se limitam aos preços de ingresso, mas que são parte componente de um conjunto de problemas que envolve a organização do futebol no Rio de Janeiro e no Brasil de um modo geral.

O público presente no jogo Resende x Bonsucesso foi de 350 pessoas.

Esse número parece pequeno e de fato o é, se não levarmos em consideração as condições da realização da partida.

Na verdade, 350 pagantes constitui um milagre futebolístico, porque quando saí de casa, achei que eu seria uma das únicas pessoas a estar sentada nas arquibancadas do Giulite Coutinho.

Apresento aqui nesse post uma fórmula bastante eficaz para que um jogo de futebol tenha um público baixo, mesmo dentro de um campeonato com repercussão midiática como o Carioca.

Públicos baixos como o de Resende X Bonsucesso se soma às estatísticas gerais dessa competição sem que se avalie suas especificidades que, muitas vezes, são desconsideradas não apenas pela imprensa esportiva como pelos gestores do nosso futebol.



Os estaduais e os circuitos locais

O Resende foi fundado em 1909 e o Bonsucesso em 1913 e, mesmo centenários, por diversos motivos eles não conseguiram uma projeção futebolística para além das fronteiras locais. 

Time do Resende. Fonte: http://www.resendefc.com.br/2010/view.php?show=9&pag=32

Os chamados clubes de menor investimento costumam ter seu público torcedor e espectador atrelado a uma geografia local, circunscrita, sobretudo, a bairros. Além desse aspecto, é comum que o público que assiste a jogos envolvendo esse tipo de clube, seja formado não por indivíduos motivados pelo pertencimento clubístico, mas que estão no estádio para torcer circunstancialmente pelo time que representa o bairro onde mora. Pessoas que vão para torcer por um clube que é parte componente de sua memória e da paisagem urbana que o circunda.

Sendo assim, é importante que jogos de clubes como Bonsucesso, Madureira, Resende entre outros sejam realizados em praças esportivas no mínimo próximas aos locais aos quais esses clubes têm sua história atrelada.

O clube Resende nasceu na cidade homônima que fica a 167 km de distância do Rio de Janeiro:



Especificamente em relação ao bairro de Edson Passos, no município de Mesquita, onde se localiza o estádio Giulite Coutinho, são 137 Km:




O mando de campo do jogo de domingo era do Resende, o que significa que o ideal era que a partida fosse realizada no seu estádio, o Estádio do Trabalhador. Mas esse estádio, até o dia do jogo, ainda não tinha seus laudos aprovados. 

Por outro lado, o Bonsucesso é time do subúrbio homônimo e que fica localizado a razoável distância da Baixada Fluminense.

Para o público dos bairros do entorno do Giulite Coutinho, Resende X Bonsucesso mostrava-se pouco atraente enquanto espetáculo já que unia dois clubes que estão fora do circuito principal do futebol carioca.

Portanto, é de se espantar positivamente que 350 pessoas tenham estado presentes ao jogo:



Porque ainda existem milagres no futebol....


Milagroso também foi o público do estádio de Los Larios, cerca de 900 pessoas para assistir Bangu X Madureira. Ótimo público, em se tratando de um jogo realizado no estádio do Tigres, da Baixada Fluminense, envolvendo dois clubes do subúrbio carioca, ambos com estádios, ainda, vetados para receber partidas do Carioca.

Sendo assim, públicos baixos não se explicam somente pelo preço do ingresso, mas deve-se a outros fatores que se relacionam a um complexo panorama do futebol brasileiro. 

Em seu próximo jogo, o Resende poderá usar seu próprio estádio para jogar contra o Tigres, já que o que Estádio do Trabalhador foi liberado pela Ferj através da Resolução da diretoria, RDI nº 006/15.

Não há garantias de que o público desse jogo seja muito maior que o do Giulite Coutinho, mas pelo menos a equipe não precisará de um deslocamento tão gigantesco para jogar a partida e os prejuízos financeiros podem ser menores.


RESENDE X BONSUCESSO

Desde 2002, o Giulite Coutinho não recebia jogos da Série A do Carioca. Recentemente, esteve fechado para reformas no gramado, sistema de irrigação, assim como pintura do estádio e outras obras visando torná-lo apto a receber jogos da série A, incluindo os do time grande.

Em comparação a minha última visita, o Giulite de fato está modificado, especialmente na pintura, onde o vermelho está mais vivo.

Pela primeira vez fui a essa estádio usando transporte público e a melhor opção é o trem, ramal Japeri. É preciso saltar na Estação Edson Passos, de onde do alto da passarela já é possível avistar os refletores do estádio.

O acesso não é difícil podendo-se chegar de trem ou de ônibus. Em relação ao centro do Rio, trata-se de uma viagem um tanto longa. Em relação aos subúrbios do Rio, dependendo do local se faz necessário um certo planejamento, podendo ser necessário o uso de mais de um transporte público. 

Este ano, o estádio está liberado para receber jogos dos times "grandes" do Rio de Janeiro, o que particularmente acho ótimo.

Para Resende x Bonsucesso, o ingresso custou R$ 10,0.



A caminho das arquibancadas, passamos bem próximo ao gramado. Lá ao fundo o jogo preliminar  Resende X Bonsucesso, categoria Sub-20.



Nas arquibancadas cobertas foi feita uma divisão entre as torcidas. Do lado, ficou a torcida do Resende:





Bem de pertinho, podia-se ver o aquecimento e a oração dos jogadores do Resende:







Nas arquibancadas descobertas do lado esquerdo, quase não havia gente, apenas um grupo que se posicionou atrás de uma bandeira do Bonsucesso que fazia referência a uma música de Roberto Carlos:



No meio desse grupo havia um flamenguista





Na arquibancada de frente podia-se avistar um torcedor - ou espectador- solitário:






Do lado esquerdo das arquibancadas cobertas, estava a torcida do Bonsucesso em maior número e contando com a presença de torcedores de carteirinha como é o caso do George:



George e o grupo de torcedores do Bonsucesso:



No campo o jogo rolava com certa vantagem do Resende que se apresentou melhor organizado taticamente, melhor preparado fisicamente e que já nos 16 minutos do primeiro ganhava o jogo por 1 x 0 com gol de Geovane Maranhão.




No segundo tempo o Bonsucesso bem que tentou, sobretudo, com insistentes cruzamentos na área:




 Por sua vez, o Resende se contentou com o gol único.

Um jogo tecnicamente fraco e pouco emocionante, em uma tarde chuvosa de sábado:





Jogos fracos e pouco emocionantes podem ser facilmente encontrados no campeonato brasileiro, isso não é uma exclusividade dos Estaduais e dos times considerados menores.

O que particularmente me preocupa é grande parte das discussões em torno dos estaduais, especialmente, do Rio de Janeiro, desconsideram que se quisermos de fato melhores públicos e melhores jogos, é preciso que se pense em formas menos predatórias de distribuição de ganhos entre os clubes. 

Abismos financeiros tem sido criados entre os clubes de futebol no Brasil, tornando muito difícil a existência de clubes  tradicionais do cenário nacional.

O circuito principal do futebol no Brasil, como já foi dito aqui diversas vezes, tem se tornado cada vez mais restrito a clubes que conseguem acompanhar – mesmo que de modo um tanto precário - o ritmo mercadológico do futebol atual.

Grande parte dos clubes brasileiros não possui condições de ir além das fronteiras dos estados e sua atuação se restringe a competições regionais, em suas diversas divisões e modalidades. Sendo assim, campeonatos regionais como o Carioca, Copa Rio, Copa São Paulo, Campeonato Paulista etc., são a única possibilidade de atuação de diversos clubes no Brasil.

Quando se cogita em acabar com os Estaduais por ele se mostrar um campeonato inadequado aos tempos atuais e por se considerar que ele toma demasiado tempo no calendário dos clubes, há de fazer uma importante ressalva: os estaduais tomam tempo dos clubes que dele podem prescindir.

Clubes como Bonsucesso, Bangu, Olaria, São Cristóvão e América existem aos montes no Brasil e seu calendário se resume a uma parte mínima do ano, aquele preenchido por competições locais.

Sendo assim, sempre que se fala em extinção dos estaduais me dá arrepios. Caso isso seja feito sem que se encontre competições que cumpram esse papel junto aos chamados pequenos, corremos o risco de vermos clubes centenários extintos.

Por outro lado, com estaduais organizados do modo como ocorre no Carioca, corre-se o risco de banalizar ainda mais o futebol. 

O fato é que enquanto as Federações enriquecem, diversos clubes empobrecem cada vez mais. e montam times ruins, pouco competitivos e que não atraem novas adesões de torcedores. 



Eu concordo com essa frase.

Não apenas o América, mas diversos outros clubes são patrimônio futebolístico e precisam ser mantidos vivos.

Sem saudosismos românticos e consciente de que estamos em um novo tempo é de se pensar seriamente em uma organização que possibilite que o Brasil tenha uma cultura futebolística mais plural.