terça-feira, 25 de março de 2014

Em Bangu e com frio: Audax e Macaé


Após dias e dias, finalmente a chuva chegou ao Rio de Janeiro.  E chegou com vontade.

Domingo chuvoso, com temperatura bem amena, beirando ao friozinho, ou seja, dia bom para ficar em casa escrevendo, lendo, assistindo TV, etc, etc

Dias chuvosos são um convite à preguiça. Preguiça, minha companheira constante e que só me larga quando o assunto é futebol e ultimamente, quando o assunto é Caravana.

Neste domingo o destino era Bangu e o estádio de Moça Bonita. Entretanto em campo estariam Audax e Macaé, disputando jogo cuja importância estava na possibilidade de o time de São João de Meriti se salvar do rebaixamento.

Tarefa difícil para o Audax, time com uma péssima média de gols no campeonato carioca (menos de um gol por jogo)

Mas os milagres do futebol estão aí para isso.

Fomos então, acompanhar esse jogo e matar saudades de Moça Bonita.

Saí de casa com muita chuva e correndo para pegar o trem das 14h03min, ramal Santa Cruz destino estação Guilherme da Silveira. Guilherme da Silveira que foi ministro de Getúlio Vargas, Presidente do Bangu, diretamente responsável pela construção do Estádio Proletário, e além disso tudo, também presidiu a fábrica de tecidos Bangu.

 

EM BANGU

Chegando a estação Guilherme da Silveira, nos deparamos com a praça homônima praticamente deserta.















Famintos fomos em busca de algo para comer.

Beliscamos salgadinhos em um barzinho cheio de cadeiras vazias



 Quando saí de casa tive a sensação de que eu e Martin seríamos os únicos presentes no jogo, impressão aumentada ao olhar para a entrada do estádio.

 

 
Comprei o ingresso por R$ 20,00 e entrei no estádio.


 




 



















As arquibancadas descobertas quase que completamente vazias.

Eu disse quase ....


 
Já as sociais estavam cheias, sobretudo porque tem cobertura



















Acho que foi o primeiro jogo que estive em que não observei a presença de faixas de torcedores.

O público parecia ser formado em sua maioria por parentes de jogadores, diretoria dos clubes e outros profissionais ligados ao futebol

 
 



A presença dos típicos torcedores só se fazia notar por restos de festas anteriores:

 

 






















O JOGO

O jogo em si foi meio morno no primeiro tempo, mas com clara tentativa do Audax de tentar fazer um gol. Essa tentativa entretanto esbarrou nas várias limitações do time

 















0 x 0 no primeiro tempo e aproveitamos para tomar um café na cantina do clube, aliás um ótimo café.
 
 
 
A Cantina localiza-se na entrada do clube onde de cara nos deparamos com uma enorme faixa que expõe uma enigmática frase de Castor de Andrade 






Além dessa faixa, há a memória das conquistas passadas









Notem que o técnico do Bangu campeão de 1933 foi o técnico da seleção brasileira que foi a Copa em 1934






Demos um rolé pelo clube
































E voltamos para o segundo tempo.





Cheguei a pensar que o Audax venceria, mas as chances mais evidentes e perigosas eram o Macaé.



 
 
 

 

 




Então aos 45 minutos o Macaé fez um gol e a tarefa do Audax que já era difícil, ficou impossível.

Final de jogo: Macaé 1 x Audax 0


Após dois anos de permanência na primeira divisão do Carioca, o Audax foi para a segunda divisão






Essa queda foi presenciada por cerca de 250 pessoas e filmada por uma câmera





Até a próxima....
 

sábado, 8 de março de 2014

ALEGRIA E TRISTEZA NO MESMO TIME: SAMBA, CARNAVAL E UM POUCO DE FUTEBOL


Não sou pesquisadora de samba ou carnaval. Minha relação com o samba é de puro gosto e admiração sendo, portanto, uma relação que poderíamos chamar de intuitiva e que não passa por análises mais profundas.

Meu compromisso com o samba e o carnaval é mediado por uma forte memória afetiva, especialmente em se tratando de Portela cujos sambas do início da década de 1980 eram cantarolados por mim e minha vó.

Portela é de Oswaldo Cruz/Madureira, bairros vizinhos de Rocha Miranda onde morei durante 38 dos meus 39 anos.

Mas essa proximidade sentimental com a Portela nunca me impediu de ter um carinho e até torcer por outras escolas como a Império Serrano (escola do meu pai), União da Ilha (dos sambas inesquecíveis e de Aroldo Melodia) e do Salgueiro (escola da minha mãe)

Pode parecer estranho mas os modos de torcer por uma escola de samba difere bastante dos de torcer por um time de futebol. O futebol requer um tipo de relação monogâmica, meio possessiva, em que não cabe – ou acredita-se que não  - nenhum de tipo de amor dividido ou compartilhado com outros times.


Eu particularmente não divido meu amor pelo vasco com outros times. Jamais.

Porém o território do samba parece ser movido por uma dinâmica diferente dessa. Podemos ter uma escola “do coração”, mas comemorarmos a vitória de alguma outra agremiação.

Isso significa que não existe rivalidade?

Claro que há, algumas até um pouco acirradas. Existem escolas que não são nada bem vistas e mesmo pouco toleradas entre alguns torcedores adversários.

Mas a impressão que tenho  – e é uma simples impressão – é que tão ou mais importante que as escolas é o  uma entidade chamada samba.

 Pelo menos é isso que sinto e me faz adorar o samba e a cultura que o cerca.


Cultura esta fascinante por comportar coisas que às vezes parecem pertencer a mundos que aparentemente não se misturam, como é o caso da alegria e da tristeza.

Esse convívio é fascinante e pude percebê-lo de perto na quadra do Salgueiro onde fui acompanhar a apuração do desfile das escolas de samba.

A derrota do Salgueiro partiu meu coração, porque enquanto estava na quadra compartilhei a torcida pela escola da Tijuca e porque achei injusto o resultado


Entretanto mesmo com o coração partido enxuguei as lágrimas e após sambar um pouco ao som da Furiosa fui direto para a quadra da Unidos da Tijuca.


A apuração e o Salgueiro

Diferentemente dos campeonatos de futebol, o desfile das escolas de samba é uma competição que acontece em um único dia, ou melhor, noite, na qual pouquíssimas coisas podem dar errado.

São cerca de 80 minutos que selam um ano inteiro de trabalho intenso nos barracões das escolas. Hoje em dia trata-se de um trabalho cada vez mais profissionalizado e que envolve uma estrutura altamente mercadorizada.

Nesse quesito o mundo das escolas de samba é um pouco menos democrático e surpreendente que o futebol, porque dificilmente uma escola que dispõe de poucos recursos ganhará um desfile.

É certo que é possível que escolas muito bem estruturadas financeiramente desapontem na avenida, por motivos diversos, como foi o caso da Beija Flor este ano. Mas são exceções. Nos últimos anos os títulos têm se revesado entre escolas financeiramente poderosas.

A Unidos da Tijuca rompeu essa lógica em 2002 quando a criatividade na composição de carros como o DNA humano foram tão espetaculares que quase fez de um escola pouco comentada, campeã daquele ano.
Mas com o tempo e vários vices campeonatos a Unidos teve que anexar criatividade com alegorias bem acabadas, coreografias impecáveis, efeitos especiais sofisticados, tudo isso somado a um trabalho muito profissional e caro capaz de fazer com tudo isso funcione antes e na hora do desfile.

Por esses motivos, certamente há muitos que condenam ou veem com maus olhos os desfiles de escola, achando-os produtos extremamente mercadorizados e voltados quase que exclusivamente para o olhar turista.

Ainda não me bateu essa desilusão em relação aos desfiles, embora saiba que o público da Marquês de Sapucaí seja composto massivamente por turistas que pagam caro para ali estarem.

Se compararmos com recentes jogos do Maracanã os preços dos ingressos da Sapucaí não são tão absurdos. No último Flamengo e Vasco, o ingresso mais barato custava R$80. Na Sapucaí os ingressos populares custam R$10.

É certo que não se trata do melhor lugar de se ver o desfile, assim como não o era a geral dos estádios, mas pelos menos a possibilidade de estar presente ao espetáculo é financeiramente mais viável  e em se tratando de um evento que ocorre uma vez por ano, pode valer a pena


E por ocorrer uma única vez no ano, o desfile é tudo ou nada e qualquer erro pode ser fatal, porque no fundo ganha não exatamente a escola que acertar mais, porém sim aquela que erra menos.

Por isso a apuração é um momento nervoso e cheio de expectativa sejam elas boas ou más.

Tinha más expectativas em relação a Vila Isabel, afinal foram grandes as falhas ocorridas no desfile.

Tinha ótimas expectativas em relação ao Salgueiro, porque tinha um samba fabuloso e fez um desfile quase impecável.

Quase ... pelo menos aos olhos dos julgadores.

Seja como for, movida por essas ótimas expectativas e por uma imensa curiosidade fui assistir a apuração na quadra da escola vermelha e branca da Tijuca.


O SALGUEIRO

Na chegada à quadra já era perceptível uma atmosfera confiante nos moradores ao redor, nos componentes da escola e em pessoas como eu. Por isso, assim que entrávamos na quadra recebíamos um papel para segurarmos durante a apuração, nesse papel estava escrito em vermelho: é campeão!













E esse entusiasmo só aumentou  após o primeiro quesito no qual o Salgueiro levou 10 de todos os julgadores, porém logo depois o Salgueiro começou a perder alguns pontos preciosos e foi caindo até ficar em 3º lugar.

Algumas perdas de ponto podem ser irreversíveis, mas as principais concorrentes do Salgueiro também começaram a perder pontos e com isso o Salgueiro saltou para primeiro passando a disputar décimo a décimo com a Unidos da Tijuca.




As baianas do Salgueiro




Mas essa disputa ponto a ponto deixou a baiana do Salgueiro assim:




Somente no final, no quesito bateria – a grande esperança salgueirense – é que a Unidos já no terceiro jurado, confirmou sua vitória.



















Restou ao Salgueirenses o choro, mas um choro que se misturou a manifestações de alegria ao som do samba enredo e da bateria furiosa:




















Particularmente fiquei fascinada – uso essa palavra novamente - porque como diz Nelson Sargento “Samba, agoniza mas não morre, alguém sempre te socorre, antes do minuto derradeiro” (...)

Tanto não morre que fui para a quadra da Unidos da Tijuca após algum tempo ali curtindo esse momento quase que epifânico.


UNIDOS DA TIJUCA: CARNAVAL E UM POUCO DE FUTEBOL

A conquista da Unidos foi algo razoavelmente inesperado para mim. Achei particularmente que foi o mais fraco desfile da escola, nos últimos 3 anos. Mas, não sou especialista no assunto e o que me importava no momento era experimentar a festa da Unidos:








 A Unidos da Tijuca é uma agremiação antiga, mas somente recentemente tem conquistado títulos no carnaval carioca.

Particularmente tenho simpatia pela Unidos por causa do Paulo Barros e porque ela já fez do Vasco da Gama enredo cujo samba até hoje é cantado pela torcida cruzmaltina. Na verdade a Unidos conta com a simpatia de muitos vascaínos, até mesmo porque seu presidente é torcedor declarado e já teve a intenção de se candidatar a presidente do clube.

Essa simpatia se fez notar na grande presença de bandeira do Vasco e da torcida organizada Força Jovem com a qual me deparei logo na entrada da quadra:








Em São Paulo é muito comum essa relação entre escola de samba e torcida organizada, como é o caso da Gaviões da Fiel e da Mancha Verde, mas aqui no Rio isso não se faz presente, pelo menos de modo claro  e incisivo.

Confesso que gostaria que essa distância fosse mantida, porque o torcer no futebol está impregnado de rivalidades que não se entrecruzam. A identidade torcedora muitas vezes é afirmada pela quase que total negação da alteridade.


Como comentei no início, não percebo esse tipo de construção indentitária no samba, por isso mesmo de vermelho entrei na festa da Unidos cujas cores são amarelo e azul. Por isso, gente que tava na quadra do Salgueiro - mesmo vestido com a camisa dessa agremiação - também foi para a mesma festa. E todos fomos muito bem recebidos.



















Claro que adoro ver a bandeira do Vasco onde quer que seja, mas prefiro ver o mundo do samba do modo como ele tem sido, com convivências possíveis, com amores não exclusivos, mas voltados para a alegria mesmo que ela ande misturada com a tristeza.

A festa da Tijuca estava ótima e o samba - que foi muito criticado - funcionou muito bem naquele espaço de festividade pura.

E eu de vermelho festejei com meus sapatos pisando na lama. 





Um brinde ao samba




É melhor ser alegre que ser triste
Alegria é a melhor coisa que existe
É assim como a luz no coração

Mas pra fazer um samba com beleza
É preciso um bocado de tristeza
É preciso um bocado de tristeza
Senão, não se faz um samba não

(...)
Fazer samba não é contar piada
E quem faz samba assim não é de nada
O bom samba é uma forma de oração

Porque o samba é a tristeza que balança
E a tristeza tem sempre uma esperança
A tristeza tem sempre uma esperança
De um dia não ser mais triste não

(Samba da Benção, Vinícius de Moraes)