sexta-feira, 8 de maio de 2015

Parabéns às mulheres

Muitas mulheres foram importantes na trajetória de conquistas femininas na história do Ocidente. Muitas lutas foram travadas para que hoje nós mulheres possamos ter mais acesso a uma série de bens que durante muitos anos ficaram restrito aos homens.

O esporte ocupa lugar importante na trajetória de inserção da mulher nos espaços públicos, o que em grande medida significou um passo importante para possibilitar que a mulher ultrapassasse os limites da casa e de uma série de atividades que lhe eram destinados de modo naturalizado e muitas vezes contra sua própria vontade.

Essa inserção nos espaços públicos se deu sobretudo se pensarmos a mulher enquanto espectadora dos eventos esportivos, os quais podia assistir, mesmo que quase obrigatoriamente acompanhada de seus maridos.

Na dimensão atlética, a relação entre mulher e esporte desde cedo mostrou-se problemática, cercada de preconceitos e empecilhos que dificultaram sua atuação em modalidades diversas, em especial aquelas consideradas como “masculinizantes”. Entre esses esportes estava o futebol.

Em relação ao futebol há um grupo de mulheres digno de ser sempre lembrado e exaltado ainda mais no dia 8 de março, dia internacional da mulher.

Me refiro ao The Dick, Kerr Ladies, um time formado por operárias da fábrica de armamento homônima localizada em Preston e que tinha como dono dois escoceses William Dick e John Kerr.

Operárias e jogadoras de futebol. Fonte: http://thehistoryofwomensfootball.com/early-1900s.html

Durante a primeira guerra mundial, muitas mulheres se tornaram operárias sobretudo devido ao fato de os homens estarem nos campos de batalha.

Como ocupação do tempo livre, muitas operárias praticavam esportes entre os quais o futebol.  Times despretensiosos foram sendo formados e partidas sendo realizadas muitas delas tendo como motivação a arrecadação de dinheiro para caridade. Ter mulheres jogando futebol servia como atrativo para um público pouquíssimo acostumado a vê-las jogando, já que esse esporte era considerado inadequado ao físico e à “moral” feminina.

De todos os times formados, o mais popular, especialmente devido a sua qualidade, foi o The Dick, Kerr Ladies que jogou mais de 800 jogos ao longo de sua existência.  O The Dick destaca-se na história do futebol feminino por sua popularidade e por ter persistido a continuar jogando mesmo após o fim da guerra e a proibição do uso dos gramados da liga inglesa de futebol. 

Enquanto muitos times acabaram, o The Dick continuou jogando, fazendo algumas excursões internacionais.

Sua principal jogadora foi Lily Parr que conseguiu a façanha de marcar cerca de mil gols na sua longa carreira futebolística que durou mais de 30 anos.

Lily Parr.  Fonte: https://www.pinterest.com/pin/494692340291495741/


Tanto Lily quanto seu time, o Dick Kerr Ladies – que deixou de existir somente em 1965 -, tiveram papel relevante na história do futebol feminino não apenas na Inglaterra. Mesmo com os olhares tortos da sociedade e das federações de futebol, a persistência do time em continuar a jogar foi importante para dar mostras de como a modalidade feminina era cercada de preconceitos que foram sendo aos poucos amenizados.

Em 1971 a Fotball Association oficializou o futebol feminino e no mesmo ano a UEFA recomendou que outras federações seguissem o mesmo caminho. Essa legitimação por parte das federações lançou nova luz sobre a trajetória feminina nos gramados.
Os ecos desse momento chegaram ao Brasil que no início da década de 1980 teve um importante boom do futebol feminino.

Com tantos tropeços não é de se admirar que o futebol feminino seja ainda uma modalidade que está longe do status adquirido pelo masculino.

Mas esperemos que de fato, e especialmente no Brasil, as coisas mudem e o futebol feminino deixe de ser um esporte sazonal, sobretudo reduzido às participação da seleção brasileira nas Olimpíadas.

E espero que nós mulheres deixemos de ser vistas sob prismas estereotipados que ora nos vêem como frágeis, ora como belas, comparadas a flores e etc, etc.

Por mais que essas comparações tenham intenções lisonjeiras elas também contribuem para manter a imagem da mulher aprisionada a formas tradicionais de representação que durante muito tempo somente serviram para justificar a manutenção da desigualdade entre os gêneros masculino e feminino.

Dizer que ser mulher é, definindo-a com uma série de características vistas como naturais... é uma mania que precisa ser cada vez mais enfraquecida. 

E o mesmo podemos dizer em relação a frases como ser homem é... 

Há uma diversidade de composição identitária que deve ser plenamente aproveitada e respeitada. As identidades femininas vão além das flores, na verdade muitas mulheres sequer gostam de flores, preferindo chocolates, celulares, bicicletas, carros etc, etc e bolas.... bolas de futebol.

Acho que era mais ou menos isso que Virginia Woolf certa vez quis dizer:

Mesmo que seja possível afirmar o valor de um dom qualquer num dado momento, esses valores se modificam; em um século, eles se terão, com toda a probabilidade, modificado por completo. Além disso, dentro de cem anos, pensei alcançando minha porta de entrada, as mulheres terão deixado de ser o sexo protegido... Tudo pode acontecer quando a feminilidade tiver deixado de ser uma ocupação protegida (Um teto todo seu, p.45)

Parabéns a todas as mulheres de todos os tipos e gostos e, em especial, para aquelas que amam futebol sejam elas jogadoras, jornalistas, torcedoras ....