terça-feira, 18 de junho de 2013

O futebol não é mais forte que a justa insatisfação das pessoa...

(Fonte: http://www.jb.com.br/pais/noticias/2013/06/17/manifestantes-invadem-cobertura-do-congresso-nacional-em-brasilia/)
Blatter, o presidente da FIFA, disse que “O futebol é mais forte que a insatisfação das pessoas”. (http://www.estadao.com.br/noticias/esportes,o-futebol-e-mais-forte-que-a-insatisfacao-das-pessoas-diz-presidente-da-fifa,1043432,0.htm)
Não. 

Se assim o fosse, por que a Fifa demonstrou tanta insatisfação ao longo dos preparativos para a Copa de 2014 e por que fez tantas exigências a respeito dos estádios, por exemplo?

Afinal se o futebol é mais forte que a insatisfação das pessoas, deveria ser mais forte que qualquer insatisfação da própria FIFA, com prazos, estrutura do evento etc.

Blatter provavelmente deve estar se referindo ao “futebol da Fifa” e seus megaeventos, que de fato podem nos fascinar, mas que se inserem em questionáveis formas de gerência esportiva e de articulações políticas.
“O futebol da Fifa” de fato tem ambição de ser mais forte que tudo que o cerca.

A insatisfação que Blatter generaliza e confere certo tom minimizador é na verdade um sentimento que também se relaciona aos gastos abusivos feitos para a realização da Copa de 2014.

É de se ressaltar que a Copa de 2014 não é o único exemplo de superfaturamento. Há inúmeros outros que se relacionam a construção de hospitais, escolas e estradas.

Mas é muito interessante perceber que a Copa de 2014 – e a das Confederações – têm sido um dos importantes catalizadores das manifestações populares que temos visto.

A começar pela proposta “vem pra rua” que é refrão da música de autoria de Simoninha e cantada pelo Falcão do Rappa em um dos comerciais feitos para a Copa.

O “vem pra rua” foi apropriada como convocatória para a ocupação das ruas de diversas cidades do país para reivindicações que ultrapassam e muito a redução das tarifas de ônibus.

Outro importante fator mobilizador foi a cobertura da Copa das Confederações realizada por parte da imprensa, cobertura celebratória, ufanista e que tentou fazer de cada jogo uma ilha de perfeição, tentativa iniciada pela questionável partida entre os amigos do Ronaldo X amigos do Bebeto.

Então veio o aumento das tarifas dos meios de transporte que têm um impacto imediato em nossos bolsos. Meios de transporte que vivem lotados, que não oferecem conforto e segurança (como os estádios da Fifa oferecem...) e que são concessões públicas que vão parar nas mãos de empresários que apenas visam o lucro, às custas da necessidade imediata de locomoção diária.

Esse aumento foi a gota d’água para fazer com que aquela ilha de perfeição - montada pelo discurso de parte da imprensa – ressaltasse por contraste todos os problemas que vivemos como a violência urbana, a inflação, a desigualdade social, a intolerância e tantas outras mazelas da sociedade.

E as pessoas foram para rua, aproveitando, aliás, toda visibilidade proporcionada pelos megaeventos.
Pediu-se aos manifestantes que tivessem um comportamento “civilizado”, o mesmo que se pede aos torcedores que vão aos jogos da Copa das Confederações.

E quando esse comportamento “civilizado” não se deu do modo imaginado, houve uma tentativa de criminalização do ato de manifestar, o que se fez notar nas inúmeras agressões promovidas pela polícia.
Assim como ocorre em muitas partidas de futebol, a polícia deu diversas demonstrações da falta de preparo em lidar com as multidões. E o resultado foi o que se viu - e não se viu nas Tvs: pessoas feridas e agredidas de maneira despropositada.

A má repercussão desses atos mobilizou ainda mais as pessoas e promoveu uma mudança de atitude do policiamento que se fez notar nas passeatas de ontem.

Certamente atitudes mais revoltosas fazem parte desses eventos, afinal não estamos diante de mais um espetáculo e sim de mobilizações fomentadas por revolta e cansaço.

Temos que tomar um cuidado ao categorizarmos como vandalismo tudo aquilo que foge aos padrões de bom comportamento. É de se compreender algumas atitudes consideradas violentas e que foram pontualmente direcionadas para os espaços representativos do poder instituído.

Se por fogo na entrada da Assembleia Legislativa pode ser considerada um ato de violência é de se considerar como de extrema violência diversos processos de desapropriação ocorridos e que visavam a construção de BRTS, Metrô, Transcarioca, Parque Olímpico etc

Do mesmo modo poderíamos considerar como vandalismo a radical transformação do Maracanã assim o futuro fim do Celio de Barros e da escola Friedenreich.

Nada é tão simples. E na verdade é difícil analisar este momento.

O que é possível dizer é que diante do que vemos o futebol não é mais forte que a justa insatisfação das pessoas.
E nem poderia.

Até mesmo porque, no Brasil, o futebol não tem tido tanta força assim, ao contrário, ele anda muito enfraquecido.

Enfraquecido pela cruel lógica mercadológica que criou uma distância gigante entre os próprios clubes chamados de “grandes” e um abismo quase intransponível entre os “grandes” e os “pequenos”.

Seria muito bom que algumas formas de protestos fossem parar dentro dos estádios nos jogos da Copa das Confederações.
Por diversos motivos:
     Por que estádios são locais ótimos para manifestações públicas, haja vista a vaia que Blatter teve que ouvir.
    E, sobretudo, para não imaginarmos que todos os indivíduos que frequentam os jogos da Copa são inimigos ou alienados, simplesmente.
    Pensar desse modo é reduzir a complexidade dos fenômenos e adotar um radicalismo pouco produtivo.
    É preciso ir além.
Nesse aspecto é importante estarmos vigilantes para que essas manifestações não ganhem um tom autoritário e fascista, ganhando rumos pouco proveitosos para todos nós.

O mais importante é notar que o hábito de manifestar pode ser um importante legado dos megaeventos aqui realizados

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